Madri – Na Espanha acidentes de trânsito saem no jornal ainda que não morra ninguém. Em junho deste ano, por exemplo, o diário El País noticiou com destaque que em uma única semana ocorreram três atropelamentos com feridos em Madri, uma cidade de 3 milhões de habitantes.

São informações que surpreendem leitores latino-americanos, para quem choques sem gravidade em avenidas e estradas representam um assunto corriqueiro. “No meu país” – comentam de maneira geral os imigrantes ou turistas – “os acidentes aparecem no noticiário ou porque matam muita gente, ou porque tem famoso envolvido. Atropelamentos acontecem a cada minuto…”.

Os números falam por si: em 2010, 40.610 brasileiros perderam a vida em acidentes de trânsito. Durante o mesmo período o tráfego espanhol produziu 1.729 vítimas fatais. E na Argentina, cuja população é um pouco menor que a do país da Península Ibérica, foram 7.659 habitantes mortos por choques de automóveis.

“Todo o nosso trabalho está orientado para diminuir o número de acidentes e de vítimas. Há alguns anos éramos um dos lanternas entre os europeus. Atualmente somos um dos oito países que mais reduziram as estatísticas e estamos na liderança”, orgulha-se a porta-voz da Direção Geral de Trânsito (DGT) da Espanha, Nuria de Andrés.

Foi depois da consolidação da União Europeia como um território comum, cujas políticas de todos os países devem convergir para as normais gerais, que a Espanha começou a perceber as melhoras na segurança viária.

As medidas adotadas reduziram os índices de mortes no trânsito de 128 casos por milhão de habitantes em 2003, para 59 em 2009 – dados que estão inclusive abaixo da média europeia, que é de 69 mortos por milhão de habitante.

Mas embora tenha havido uma redução significativa de vítimas fatais nos últimos anos (os dados dão conta de “10 mil vidas poupadas” no período de 2003 a 2010), o trânsito é ainda a sexta causa de morte na Espanha. Por isso a perspectiva é atingir a audaciosa meta de 37 mortos por milhão de habitantes – quase a metade do que há hoje – antes de 2020.

Parece que eles estão no caminho. “Conseguimos esses índices graças a uma mudança de comportamento dos condutores, que passaram a entender que ter a habilitação não é simplesmente uma questão burocrática. Essa permissão para dirigir tem que ser ganha a cada dia”, prossegue Nuria.

Com 12 pontos o motorista experiente perde a carteira
Há seis anos o país ibérico adotou o sistema de pontuação na carteira de motorista: aqueles que tinham mais de três anos de habilitação ganharam 12 pontos, enquanto que os motoristas mais novatos receberam oito. As infrações significam descontos desse total e quando chega ao zero, o cidadão perde o direito de dirigir.

Desde então, 142 mil pessoas tiveram que entregar suas habilitações ao órgão de controle do governo e passar por cursos de reciclagem para poder voltar a dirigir – depois de aprovado em todos os exames.

Uma dessas pessoas foi a jornalista Patrícia Ortega Dolz, que relatou sua experiência no jornal El País, no qual trabalha. “Aquela vez foram quatro pontos e uma multa de 60 euros por não parar durante três segundos ao ver o sinal de ‘Pare’. Os pontos definitivos. Somados aos seis que perdi antes por não respeitar o sinalizador e diminuir a velocidade a 20 km/h em uma avenida e aos dois que perdi meses antes por andar a 133 km/h em uma estrada na qual o limite era 100. Se esgotou o crédito”, escreveu.

Para fazer valer a lei, a fiscalização foi reforçada com a contratação de 1.500 novos agentes de trânsito e a compra e instalação de radares em todo o país. “A reforma do código penal, que transformou as infrações – antes sanções administrativas – em delito sujeito a pena também ajudou muito”, revela a porta-voz da DGT.

Campanhas de conscientização chegam às escolas
Além de punir, o governo espanhol fornece muita informação ao motorista. Só no primeiro semestre de 2012, foram oito campanhas de conscientização veiculadas na televisão. Distrações ao volante, consumo de álcool e drogas, e as mais novas normas de trânsito são alguns dos temas.

O DGT também já iniciou a expansão dos cursos de formação, tirando-os do âmbito das auto-escolas e trasladando a colégios tradicionais, onde os crianças recebem as primeiras lições de bom comportamento no trânsito. E a intenção é instituir módulos nos currículos das universidades “de maneira que a educação viária esteja presente nos distintos setores da sociedade”, explica o Plano Estratégico de Segurança Viária 2011-2020.

Funciona, garante a porta-voz da DGT, Nuria de Andres. Tanto que os índices de jovens envolvidos em acidentes de trânsito tem caído a cada ano. “Antigamente, o número de mortes era maior entre as faixas etárias mais baixas, mas essa tendência está mudando. Os jovens são mais sensíveis a campanhas de conscientização”, comemora ela, que sublinha, entretanto que entre os 35 e os 54 anos se encontram as pessoas mais resistente a mudanças.

“Primeiro se explica as regras de trânsito e uma vez feito isso, é preciso controlar. Então a estratégia de educação para a cidadania é sempre acompanhada da possibilidade de multa. É preciso cumprir com o que está determinado”, conclui.

FONTE: Correio do Brasil