Inacreditável
a capacidade do poder público em muitas cidades e estados brasileiros
de se manter surdo, cego, paralítico e calado diante dos clamores da
sociedade organizada por ações imediatas e efetivas para a segurança das
pessoas no trânsito. Em muitos municípios brasileiros, trânsito só é
preocupação é em época de campanha. Se elegeu ou perdeu a eleição, a
preocupação acaba.
Mortes e mais mortes no trânsito todos os dias nas cidades. Centenas
de feridos, amputados, sequelados, inválidos diariamente por esse Brasil
afora vão se somando às filas dos hospitais já cheios, saturados, sem
condições de atender os que buscam socorro por causas naturais.
Pacientes de cirurgias eletivas e que aguardam meses e até anos para
serem feitas veem os cirurgiões e suas equipes mudarem de planos na
porta dos centros cirúrgicos em cima da hora porque a prioridade é do
acidentado politraumatizado de trânsito.
O pior de tudo é que o poder público, as prefeituras, preferem
acumular prejuízos e gastos bilionários no atendimento às causas dos
acidentes do que atacar direto a raiz do problema. Mas, porquê será?
Não acreditam na educação para o trânsito combinada com medidas de
engenharia e de fiscalização? Ou porquê investir em educação e prevenção
de acidentes no trânsito não dá voto? Não é nenhuma obra física que
todos possam ver e admirar?
Incrível essa capacidade de muitos gestores do trânsito nas cidades
se manterem surdos, cegos e paralíticos diante das mortes diárias e das
infrações e maus comportamentos recorrentes dos pedestres e motoristas.
Inertes diante de uma realidade que mostra pessoas morrendo diariamente
porque na sua cidade as pessoas atravessam fora da faixa, não usam
cinto, não dão seta, porque não tem sinalização nas vias, porque as vias
estão em péssimo estado, porque sequer fiscalização existe.
O caos e o descaso chega a ser tamanho que pelo Brasil afora
centenas, milhares entre os 5.625 municípios brasileiros se aplica e se
cumpre o Código de Trânsito Brasileiro (CTB).
Eu conheço municípios que constam no site do Denatran como integrados
ao Sistema Nacional de Trânsito (SNT), que aprovaram a contratação por
concurso de guardas municipais de trânsito, mas não tem JARI como
pré-requisito para que esses agentes da autoridade de trânsito possam
começar a fiscalizar e autuar. O prazo de dois anos do edital está se
esgotando e até agora nada!
Nesses mesmos municípios não há efetivo suficiente da Polícia Militar
para atuar na fiscalização de trânsito enquanto não se contrata os
agentes e os policiais só aparecem no local quando o acidente é grave ou
se trata de uma tragédia. Onde não pátio para remover os veículos
apreendidos e irregulares, nem Escola Pública de Trânsito, tampouco
técnicos de engenharia de trânsito. Tijucas, cidade com 30 mil
habitantes em Santa Catarina é uma delas.
Gestores que se mantém cegos, surdos e paralíticos em cidades que vão
abrir os braços para receber o mundo durante a Copa e não há sequer
faixas de pedestres pintadas nos principais cruzamentos em pleno centro
da cidade. Atravessar a rua nesses pontos faz o pedestre se sentir
refém, perdido, confuso, com medo de morrer!
Pior ainda é quando o cidadão emprega uns dos poucos meios de se
fazer ouvido, a ouvidoria e a imprensa local, para reclamar, pedir
socorro e ainda assim o poder público se faz de surdo!
Muitos municípios ainda não tem Ouvidoria e nos que tem o problema
permanece sem solução. As reportagens e artigos são lidos nos gabinetes e
deixados de lado. Os prefeitos, os assessores, os secretários e
diretores, inclusive os que cuidam do trânsito e das ações educativas e
preventivas de trânsito leem e jogam de canto.
Enquanto fazem de conta que não é com eles sequer saem de seus
gabinetes para ajudar a contar os mortos junto com o pouco efetivo do
resgate.
Agora imaginem a tragédia anunciada em que as pessoas estão morrendo,
se ferindo, ficando mutiladas, inválidas, os acidentes de trânsito
sucateando ainda mais o atendimento nos hospitais, gerando custos
diários que pesam na estrutura dos municípios e não se faz nada para
tentar resolver o problema.
Por um lado, a sociedade não se organiza, não se mobiliza de forma
organizada e efetiva para reivindicar. Ao mesmo tempo, não cabe à
sociedade cumprir com o que é de incumbência, competência e atribuição
do poder público. O que cabem são parcerias, a busca de soluções
conjuntas, mas para isso o poder público tem que ter interesse.
A coisa anda tão feia que publiquei nas páginas que administro na
internet se haveria algum município e gestores interessados em parceria e
acompanhamento para implantar um Plano de Humanização do Trânsito em
nível de gestão e dos 5.625 municípios brasileiros sabem quantos se
interessaram? Nenhum.
Enquanto isso, num país em que o poder público e seus gestores se
fazem de surdos, cegos e paralíticos diante do problema e das
consequências locais, a cada 30 segundos registra-se um acidente de
trânsito no Brasil.
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