A bicicleta é mais do que um simples modo de transporte. Não polui e 
ainda contribui muito para a saúde de seus condutores. Exatamente por 
isto, a Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei nº 12.587/12) a 
estabelece como prioritária, junto com outros tipos não motorizados, 
sobre os modos motorizados. Significa, portanto que o poder público 
deveria ser o primeiro a cumprir esta hierarquização.
De acordo com Antônio Nélson Rodrigues da Silva, do Departamento de 
Engenharia de Transportes da Escola de Engenharia de São Carlos da 
Universidade de São Paulo (EESC-USP), o poder público pode e deve 
contribuir para um aumento progressivo na demanda por este modo, uma vez
 que ele já é uma tendência mundial – e o Brasil não deve fugir à regra 
nos próximos anos. No entanto, investimentos neste sentido esbarram 
muitas vezes na oposição de setores da sociedade, por exemplo os 
motoristas e comerciantes que se beneficiam dos modos motorizados, além 
da própria indústria automobilística. “Ao priorizar espaços para as 
bicicletas, invariavelmente se terá de tirar o espaço de alguém, no 
caso, os carros”, explica.
Além da infraestrutura necessária para a segurança dos ciclistas e do
 próprio tráfego em geral, fornecer a própria bike pode ser uma 
atribuição do Estado, especificamente na esfera municipal, de forma 
direta ou por meio de concessões ou permissões, o que já é uma realidade
 em outros países, segundo o que afirma a coordenadora de Educação no 
Trânsito do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), Maria Cristina
 Hoffmann. “Muitas cidades, como Copenhague, Amsterdã, Londres e Berlim 
estão em fase de adaptação para promover o aumento do uso das bicicletas
 como meio de transporte e, mais recentemente, algumas cidades 
brasileiras como o Rio de Janeiro, Brasília, Sorocaba, Santos, entre 
outras”, conta.
Apaixonado pelo assunto, o comerciante de bicicletas José Carlos 
Feliciano, de Taquaritinga (SP), comenta que outras iniciativas mundo 
afora indicam caminhos alternativos para estimular – até financeiramente
 – a utilização das bikes. “A França ,
 além de criar regras que favorecem o uso das bicicletas, está pagando 
R$ 0,77 por quilômetro percorrido para os franceses que decidirem ir 
para o trabalho por este meio.”
Dificuldades e riscos
O publicitário e empresário Tiago Benevides, de 28 anos e morador de 
Nova Iguaçu (RJ), conta que anda de bicicleta constantemente: além de ir
 trabalhar e de fazer pequenos trajetos sobre duas rodas, também treina 
distâncias médias durante a semana (de 15 km a 35 km) e longas aos 
sábados e domingos (50 km, 70 km ou mais). De acordo com ele, sua 
experiência permite observar certos “gargalos” na administração pública 
quanto a este tema. “Minha cidade não me ajuda em praticamente nada 
relacionado à bicicleta; meus treinos sempre são em horários que não 
sejam de rush, ou muito cedo ou bem tarde, já que temos apenas uma 
ciclovia cuja extensão não deve ser maior do que 3 km”, reclama. 
“Pedalar em Nova Iguaçu é para poucos: realmente é necessária muita 
atenção para andar em meio aos carros, ônibus e motos; é um risco que se
 corre, mas fazer o quê?”
Além do poder público, a iniciativa privada também pode contribuir 
para uma melhor condição do ciclismo diário, ou seja, aquele que não se 
restringe apenas ao lazer ou a pedaladas eventuais. De acordo com Lennon
 Lúcio Farias, de 23 anos, que é entregador em Curitiba (PR) e utiliza 
este meio em seu trabalho, até por falta de fiscalização do município, a
 empresa não o orientou – por exemplo – a utilizar itens de segurança. 
Ele coloca que um dos maiores riscos ocorre quando a bicicleta 
compartilha a via com outros veículos. “Por uma bike não ter barulho de 
motor, muitos não nos escutam chegando perto e facilmente podem acabar 
mudando de direção e passando em nossa frente”, explica, contando que 
costuma sempre conduzir “por si e pelos outros”, prevendo já a possível 
desatenção dos demais.
Até neste sentido, é muito importante a regra do “ver e ser visto”, 
especialmente ao se trafegar na mesma via que veículos motorizados, na 
opinião de Luiz Gustavo Campos, especialista em Gestão de Trânsito e 
Mobilidade Urbana da Perkons. “Ser visível no trânsito ajuda muito a 
evitar acidentes: roupas escuras dificultam a visibilidade noturna; o 
ideal é usar roupas claras e capacete colorido e, além dos refletores na
 traseira, dianteira e laterais da bicicleta – que são obrigatórios – 
uma lanterna com luz branca na dianteira e vermelha na traseira para 
passeios noturnos”, afirma. “Como a bicicleta é pequena e, por isso, 
pode facilmente entrar no ‘ponto cego’ dos veículos, toda atenção ajuda,
 e tudo o que puder auxiliar o ciclista a notar os demais e a ser notado
 por eles é fundamental, como o retrovisor do lado esquerdo e a 
campainha, que também são itens obrigatórios”, completa.
A atuação do Estado
Maria Cristina Hoffmann conta que, para um bom uso da bicicleta, são 
necessários cuidados especiais, como uma boa sinalização, exigência do 
uso de equipamentos de proteção e educação dos condutores. Para tanto, 
de acordo com ela, o Ministério das Cidades investe em ações de 
conscientização, especialmente cartilhas com regras de circulação. O 
órgão também apoia – além da construção de ciclovias e ciclofaixas junto
 à pavimentação de ruas – projetos de sistemas cicloviários e 
estacionamentos de bicicletas integrados aos sistemas de transporte 
coletivo estruturantes, como o metroferroviário e os corredores de 
ônibus. “O objetivo é contribuir para a construção de uma mobilidade 
sustentável em que a base seja a integração modal entre todos os modos 
de transporte motorizados e não motorizados”, esclarece.
Entretanto, como explica Antônio Nélson da Silva, especialista da 
EESC-USP, o investimento em uma infraestrutura que evite acidentes ao 
ciclista não basta. É fundamental, segundo ele, que os estudos 
realizados no âmbito acadêmico sejam levados ao ambiente técnico e 
governamental, pois – do contrário – o planejamento necessário para a 
execução destas iniciativas poderá ser insuficiente. “Há que se levar em
 conta – a exemplo do que uma pesquisa em andamento tem constatado – 
graus de exposição do ciclista a fatores como estresse e poluição 
atmosférica e sonora, isto sem contar o risco que se corre – caso não 
haja uma averiguação adequada – de se criar uma estrutura que ligue nada
 a lugar nenhum.”
O professor diz ainda que, se houver vontade política, qualquer 
pressão socioeconômica pode ser superada, na medida em que os governos 
se convençam e – com isto – levem à compreensão do povo de que um uso 
maior da bicicleta gera uma série de benefícios sociais importantes, 
como a melhora da saúde (pelo exercício físico e por uma diminuição da 
poluição do ar), além da redução de congestionamentos e de acidentes. 
“Outros países, como a Bélgica e a Holanda, tiveram vários problemas 
para implantar seus modelos, mas os governos compraram a briga”, 
completa.
Com informações da Assessoria de Imprensa

O desafio maior dos ciclistas têm sido os motoristas que não querem perder seu espaço nem fazer concessões. É preciso entender que o aumento no uso de bicicletas só trará benefícios ao trânsito e à cidade.
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