Em uma pesquisa realizada pela Volvo em 2007 intitulada de: “o Jovem e o Trânsito”, disponível neste link pelo Denatran, revela que 42% dos jovens entre 16 e 25 anos dirigem carros sem a Carteira Nacional de Habilitação (CNH), sendo 48% deles de cidades do interior. Além disso, 76% deles dirigem motos sem CNH. Entre os entrevistados, 21% dos jovens já estiveram envolvidos em acidentes de trânsito.

Não é raro acompanhar no noticiário o envolvimento de menores de idade em acidentes de trânsito. A grande pergunta é: no Brasil, jovens de 16 anos já estariam preparados para serem motoristas e, mais do que isso a responderem criminalmente às leis?

De acordo com Elaine Sizilo, especialista em trânsito e consultora do Portal, salvo honrosas exceções, os adolescentes brasileiros não têm demonstrado maturidade e responsabilidade suficientes para assumir o papel de condutor no trânsito. “Mesmo que alguns condutores já habilitados também cometam infrações e negligências, as notícias sobre acidentes envolvendo menores de 18 anos ao volante têm sido cada vez mais frequentes e graves”. Para Elaine, isso indica o quanto o assunto é banalizado nesta faixa etária, pois culturalmente a CNH acaba sendo vista como mais um documento obrigatório e de direito do cidadão, assim como o RG, o CPF ou o Título de Eleitor, diminuindo de forma considerável a percepção da responsabilidade de se tornar um condutor, explica.

Culturalmente, dirigir é como um rito de passagem, onde quem aprende se torna adulto e independente. “Muitos avós hoje, foram incentivados a aprender a dirigir desde cedo pelos seus pais, se tornando motivo de orgulho para a família. Atualmente, porém de forma menos explícita, esta pressão continua acontecendo, sobretudo em relação aos meninos. O principal problema é: que consciência de trânsito e cidadania tem um adolescente que aprendeu a dirigir nestas condições?”, questiona a especialista.


Fábio de Cristo, psicólogo, coordenador da Rede Latino-Americana de Psicologia do Trânsito e autor do livro Psicologia e trânsito - Reflexões para pais, educadores e (futuros) condutores, diz que é aceitável que o jovem inicie o processo de habilitação apenas aos 18 anos, pois, “além do aspecto legal, nessa idade, supõe-se que o indivíduo já desenvolveu aspectos psicológicos importantes na condução de um veículo (por exemplo, atenção aos estímulos da via) e estaria com maturidade psicológica para lidar com esta responsabilidade (por exemplo, as pressões do trânsito e com possíveis situações difíceis, como acidente)”, exemplifica.

David Duarte Lima, doutor em Saúde Pública e Segurança no Trânsito, além de presidente da ONG Instituto de Segurança no Trânsito revela que nos Estados Unidos e em alguns países da Europa é possível o jovem habilitar-se antes de completar 18 anos, pois lá a formação para dirigir é melhor, o controle social e policial é mais efetivo e eles utilizam mecanismos para garantir um "assessoramento prolongado" ao novo habilitado.

Por exemplo, na Bélgica no primeiro ano de carteira o condutor só pode conduzir nos finais de semana acompanhado de uma pessoa que seja habilitada há pelo menos cinco anos. “Aqui não temos esses mecanismos. Nesses países o ambiente de circulação é preparado para ’conversar e instruir‘ permanentemente o condutor sobre o que fazer. É fácil dirigir em países europeus. As decisões são tomadas antecipadamente na engenharia. Aqui, nossas ruas e estradas escondem armadilhas e a negociação com os outros participantes do trânsito tem de ser permanente”, comenta Lima.

No Brasil, se caso jovens de 16 anos pudesses legalmente se tornar condutores, isso faria com que a possibilidade de que os acidentes ocorressem ainda mais cedo. Segundo Lima, o fato de que uma parte dos garotos poderá participar de rachas e adotar práticas de "exibicionismo" com o veículo (eles são particularmente susceptíveis a esse tipo de comportamento); o Estado não está preparado para punir jovens que se envolvam em acidentes graves, haveria que mudar o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) (para ter habilitação ele tem de ser penalmente imputável) e o Estatuto da Criança e do Adolescente, além de várias outras leis, diz o doutor em Saúde Pública e Segurança de Trânsito.

Lei

Na Câmara Legislativa, tramitam projetos de lei com o objetivo que diminuir a maioridade para retirar a CNH. O Projeto de Lei 4615/12 do deputado Roberto Britto (PP-BA), por exemplo, permite a concessão de Carteira Nacional de Habilitação Especial ao maior de 16 anos de idade, desde que o responsável legal se comprometa com as atitudes do condutor. O deputado Marcelo Itagiba (PSDB-RJ) também propôs o Projeto de Lei 6934/10, que autoriza adolescentes emancipados, entre 16 e 18 anos, a obter habilitação de motorista.

Para o deputado Hugo Leal, autor da Lei Seca, advogado, bacharel em Ciências Econômicas e especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, diz que os projetos de lei nesse sentido contrariam o artigo 227 da Constituição Federal e também o Estatuto da Criança e do Adolescente. “O momento brasileiro é de esforço dos Poderes Executivo, Legislativo e do Judiciário com o inestimável apoio da sociedade civil organizada com objetivo de enfrentar todo o tipo de violência – principalmente a do trânsito que é absolutamente previsível - e não de aumentá-la”, relata.

Leal diz ser contrário a habilitação aos 16 anos, porque além de constitucionalmente o menor não responder plenamente por seus atos, são exatamente os jovens as maiores vítimas da violência no trânsito brasileiro. Tanto na condição de passageiros como, principalmente, na de condutores de veículos automotores. “Os registros dessas ocorrências indicam como causas principais dessas fatalidades o excesso de velocidade, a imprudência na direção e o consumo de álcool. São causas típicas de quem ainda não tem a perfeita consciência dos riscos e/ou a necessária experiência que permita o desenvolvimento de condutas preventivas e seguras”, explica o deputado.

Ainda de acordo com Elaine Sizilo, a polêmica gerada pelo fato de poder ou não dirigir aos 16 anos, na verdade, não está ligada a capacidade física ou psicológica do menor, mas a responsabilidade criminal que a CNH determina ao seu portador. “Algumas infrações ao volante são classificadas como crimes de trânsito, prevendo detenção do infrator. Mudar a idade mínima para se habilitar, portanto, exigiria muitas outras revisões e alterações legais no país, como adiantar a maioridade penal, por exemplo,”, diz a especialista.

Opinião

Para verificar a opinião da população, Portal realizou uma pesquisa de opinião no período de 25 de março até 05 de abril com a seguinte pergunta: Você é a favor de que jovens tirem a carteira de habilitação aos 16 anos? O resultado você confere no infográfico abaixo.

Nas redes sociais, como o facebook, por exemplo, existem comunidades que apoiam a habilitação aos 16 anos, como manifestação as leis vigentes.


Soluções

Ao invés da redução da idade para obtenção da carteira, os especialistas apontam algumas alternativas para a redução do envolvimento de jovens em acidentes.

Para Lima, “é preciso melhorar muito a possibilidade das pessoas se locomoverem sem a necessidade do carro. Construir ciclovias e boas calçadas também ajuda. Incentivo ao compartilhamento de veículos, ou carona. Para os jovens que já dirigem, a vigilância e a comunicação constante dos órgãos de trânsito com eles é fundamental. Outra ideia, é que nos finais de semana, à noite e para dirigir em rodovias, o recém habilitado só possa conduzir o veículo acompanhado de um condutor com mais de cinco anos de carteira”, diz o doutor.

A educação para o trânsito de qualidade e levada a sério em todo ensino básico, formaria não apenas condutores melhores - independente da idade, mas verdadeiros cidadãos no trânsito, muito mais conscientes dos seus direitos e deveres em cada papel assumido neste espaço, é o que diz a especialista de trânsito Elaine. “A idade seria apenas um detalhe se o candidato à habilitação tivesse uma formação coerente e contínua durante toda a vida escolar e fosse complementado com práticas de direção defensiva e avaliações realmente inteligentes”, conclui.

Ser um bom condutor, sobreviver à violência no trânsito protegendo a si, aos seus acompanhantes e demais atores desse imenso cenário denominado trânsito, exige muito mais de cada um de nós do que algumas poucas horas de ensinamento teórico e outras tantas de direção veicular. “Exige consciência cidadão e sentimento de solidariedade que só alcançamos com maturidade e experiência”, relata o deputado Hugo Leal.